No chão da calçada de pedras portuguesas, um indicativo. O mosaico com um ponteiro marcando o Norte em tons de branco e negro. Mais do que uma marca: um despertar. Fixei o olhar. Eu tinha caminhado até ali. Mas aquele ponto está no final do trapiche, sobre um molhe de pedras que impede de continuar caminhando. Para seguir naquela direção, só a nado.
Fitei o símbolo novamente e senti-me pequeno, esmagado pelo peso dos mais de 60 anos de busca. Meu outro eu viajava em pensamentos quando ouvi passos atrás de mim. Passos firmes, decididos, mas também inconsequentes. Virei-me e lá estava ele: um outro, mais jovem, mais impetuoso, mas carregando o mesmo fardo.
— Ainda procurando o Norte?
— Sempre. Não estamos todos?
O outro riu, não de escárnio, mas com uma leveza que eu havia esquecido.
— Você não entende, não é? O Norte não é um lugar, é uma ideia. E ideias, bem, podem ser armadilhas. Você passa a vida correndo atrás de algo que nunca alcança porque embaralha direção com propósito.
Voltei o olhar para o mosaico. A seta no chão parecia agora uma acusação silenciosa.
— Não é errado querer um rumo. Todos precisamos de um Norte, não? Algo que nos organize, que nos dê sentido. Caso contrário, o que somos?
Fiquei em silêncio por um momento e levantei os olhos para o horizonte. Reflito. Buscar o Norte só faz sentido se acompanharmos o olhar para o Oriente. A Luz não vem do Norte. Vem do Oriente. Mais um Natal. Mais um fim de ano.
No desespero de vencer, buscamos no externo aquilo que só pode ser encontrado no interior. O Norte é um disfarce para a angústia existencial — uma distração para não encarar a Luz que sempre esteve ali, à espera, desnudando.
Procuramos o Norte porque é mais confortável do que encarar o Oriente, onde a Luz revela quem realmente somos. O Norte é abstração. O Oriente é confronto.
Ele se aproximou e colocou a mão em meu ombro.
— Você não precisa abandonar nada. Só precisa perceber que a seta não aponta para fora, mas para dentro. O Norte que você busca está na Luz que vem do Oriente. Pare de correr. Apenas enxergue.
Voltei a olhar para o mosaico. Permaneci ali por alguns instantes, respirando fundo. Então, iniciei a caminhada de volta.
X-Scritos : Palavras que ainda vivem em mim. Crônicas de Dezembro. BC, 13-12-24.
A leitora incomum
Mais uma ousadia de minha parte. Imitar nada mais nada menos que George Steiner. Que lá do Oriente Eterno ele me perdoe.
Amor Dantônico
Confesso. Tenho um amor platônico(+). Ela é mulher, mãe, linda, e existe fisicamente neste mundo.





Perfeito como sempre.
Se considerarmos a necessidade de constante evolução do ser humano, o norte pode ser visto como a filosofia empresarial da melhoria contínua, o norte é algo virtual e inatingível, para que o aperfeiçoamento humano nunca cesse.